Ciclo de Palestras da AMRIGS reforça importância da vacinação diante de novos alertas em saúde pública
Especialistas destacam conquistas históricas, mas apontam riscos com queda da cobertura vacinal e retorno de doenças já controladas
O valor das vacinas é inquestionável. Reconhecidas como uma das maiores conquistas da saúde pública, elas evitam cerca de 3 milhões de mortes por ano em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, a imunização contribuiu para o aumento de aproximadamente 30 anos na expectativa de vida da população, erradicou a varíola e controlou doenças como sarampo, poliomielite, rubéola e coqueluche. Apesar disso, a hesitação vacinal entre famílias, responsáveis e até mesmo alguns profissionais de saúde permanece como um desafio para garantir a proteção coletiva.
O tema foi abordado no Ciclo de Palestras: Calendário de Imunização da Criança, realizado na manhã de sábado, dia 27 de setembro de 2025, no auditório da Associação Médica do Rio Grande do Sul (AMRIGS). O encontro, promovido em parceria com a Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul (SPRS), ocorreu em formato híbrido, gratuito e aberto ao público. Palestraram sobre a temática os especialistas Dr. Benjamin Roitman, membro da diretoria da SPRS e especialista em Vigilância em Doenças Transmissíveis e o pediatra e diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) Juarez Cunha, que esclareceram dúvidas, ressaltaram a importância da imunização desde os primeiros meses de vida e destacaram estratégias de proteção coletiva.
O presidente do Conselho de Representantes da AMRIGS, o médico neurologista José Renato Guimarães Grisólia, ressaltou a relevância histórica e atual dos imunizantes.
“Eu hoje sou neurologista, mas fui pediatra há alguns anos e tenho uma ligação especial com o tema da vacinação. Durante a formação e a residência, sempre incentivei muito essa prática e testemunhei a redução de várias doenças. Pelos meus cabelos brancos, pude ver, por exemplo, a queda na incidência de infecções por Haemophilus influenzae após a vacinação, assim como de tantas outras enfermidades”, afirmou.
Ele lembrou ainda que os imunizantes foram decisivos em diferentes períodos da história.
“As vacinas salvaram a humanidade em vários momentos. Durante grandes guerras, por exemplo, a vacina contra o tétano foi fundamental para proteger soldados em combate. Hoje, no entanto, estamos novamente perdendo batalhas para doenças que já poderiam estar controladas e que infelizmente voltaram a circular”, alertou.
O Brasil possui um dos maiores sistemas de imunização do mundo. O Programa Nacional de Imunizações (PNI) distribui anualmente cerca de 300 milhões de doses entre vacinas, soros e imunoglobulinas, com aproximadamente 38 mil salas de vacinação espalhadas pelo território nacional. O calendário contempla todas as fases da vida, de crianças a idosos, assegurando proteção contínua.
Para o médico Benjamin Roitman, o impacto da vacinação vai muito além da prevenção individual.
“Se todos em um grupo são vacinados, o risco de transmissão da doença praticamente desaparece. Agora, se em uma comunidade de 100 pessoas apenas 95% estão imunizadas, ainda assim teremos uma proteção significativa: talvez um ou cinco indivíduos possam adoecer, mas a circulação do agente infeccioso será muito limitada. Esse conceito, conhecido como imunidade de rebanho, garante que até pessoas que não podem ser vacinadas, como aquelas com condições de saúde específicas, estejam protegidas indiretamente. Essa é a verdadeira força da vacinação em saúde pública”, explicou.
Entre as preocupações atuais, a coqueluche chama atenção pelo risco aumentado em bebês. O pediatra Juarez Cunha, destacou a necessidade de estender a proteção para além da criança.
“Na nossa opinião, a vacina tríplice acelular deve ser utilizada por todos, em substituição à dupla adulto, porque oferece cobertura contra a coqueluche em todas as faixas etárias. Por isso, recomendamos uma estratégia que não envolve apenas a imunização da gestante, mas também do pai, da avó, da madrinha, da babá — todos que têm contato com o bebê. No entanto, a principal medida de proteção continua sendo vacinar a mãe durante a gestação, já que é ela quem garante a primeira barreira contra a doença nos dias mais vulneráveis do recém-nascido”, destacou.
Outro ponto de atenção é o retorno do sarampo. Entre as Semanas Epidemiológicas 1 e 35 de 2025, foram confirmados 24 casos no país, distribuídos entre Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Tocantins. A maioria ocorreu em pessoas sem histórico vacinal, incluindo duas crianças menores de um ano. No Tocantins, 19 casos se concentraram em uma comunidade com baixa adesão à imunização. Especialistas reforçam que a vacina é a principal forma de evitar novos surtos da doença.
O alerta da AMRIGS e da SPRS é categórico: manter o calendário vacinal atualizado é um compromisso individual e coletivo, fundamental para preservar conquistas históricas da Medicina e proteger o futuro das próximas gerações.
Redação: Marcelo Matusiak